Em 1970 é criado, num escritório em Formosa, Goiás, o nome Friboi — uma junção entre as palavras “frigorífico” e “boi”
Em 1970 é criado, num escritório em Formosa, Goiás, o nome Friboi — uma junção entre as palavras “frigorífico” e “boi”

O consumidor vai ao supermercado comprar carne para o almoço da segunda – pode ser patinho, coxão mole, acém. Observa as opções: tem na bandeja, embalada a vácuo, pendurada no cabide do açougue. Considera o aspecto geral, a cor, a quantidade de gordura, a consistência, a data de validade, o preço. Analisa as variáveis e coloca a peça escolhida dentro do carrinho. A marca? Ele não sabe, nem procura saber. Procedência, método de trabalho do produtor? Também não pensou a respeito. Pesquisas apontam que, há questão de cinco anos, o processo de decisão de compra da carne ocorria, na maior parte dos casos, desse jeito aí. Águas passadas. Hoje, quando o assunto vem à tona, uma marca é servida de bandeja, no ponto, sem nem passar pela grelha: Friboi.O pequeno comércio de José Batista Sobrinho, iniciado em 1953, na cidade de Anápolis, Goiás, acabou se transformando na maior companhia do mundo em proteína animal, a JBS, dona da marca Friboi e muitas outras. A empresa que, lá trás, tinha capacidade de processamento de cinco cabeças de gado por dia está presente hoje em 22 países, nos cinco continentes – com plataformas de produção ou escritórios comerciais –, possui cerca de 215 mil colaboradores em todo o mundo, exporta para mais de 150 nações e atende a aproximadamente 300 mil clientes globais.

Sucesso nos negócios.

O crescimento meteórico é resultado de diversas aquisições aqui dentro e lá fora. Entre 1970 e 2001, a JBS já se firmava no setor de carne bovina nacional, com capacidade de abate na ordem de 5,8 mil cabeças/dia. Nos cinco anos seguintes, de 2001 a 2006, já eram 21 plantas no Brasil e outras cinco na vizinha Argentina, elevando a capacidade de abate para 19,9 mil cabeças/dia. O pontapé inicial para a internacionalização ocorreu em 2005, quando a empresa adquiriu 100% do capital social da Swift-Armour, maior produtora e exportadora de carne bovina na Argentina. Pouco tempo depois, em 2007, a JBS mexeu com os ânimos do ramo frigorífico ao abrir capital na bolsa de valores BM&FBovespa.

Propaganda fundamentada em testemunhal do ator Tony Ramos criou um fenômeno recente de linguagem popular mesclada com uma proposta de qualidade. Que funcionou.
Propaganda fundamentada em testemunhal do ator Tony Ramos criou um fenômeno recente de linguagem popular mesclada com uma proposta de qualidade. Que funcionou.

Outros marcos de sua trajetória são: aquisição em 2007 da Swift Company, abrindo caminho nos mercados de bovinos e suínos nos Estados Unidos e na Austrália; a incorporação em 2008 do frigorífico Bertin, até então o segundo maior do Brasil; o controle acionário a partir de 2009 da Pilgrim’s Pride, ingressando no mercado norte-americano de aves; a abertura de capital da Vigor, que, portanto, deixou de ser uma subsidiária da JBS; e a aquisição em 2013 da Seara Brasil, tomando a posição de líder global no processamento de aves. Também em 2013, o grupo passou a atuar no segmento de alimentos industrializados e virou a segunda maior plataforma do país de produção e distribuição de produtos de valor agregado.

O negócio da família Batista prosperou e, claro, atraiu atenção. Ganhava notoriedade na mesma proporção em que fechava acordos importantes – compra de empresas, de ações. Isso no mundo corporativo. Para a população em geral, JBS, até 2010, eram letras fora da ordem alfabética. E o pior: carne boa era carne vermelhinha, macia, de preferência na promoção. Numa época em que estouros de frigoríficos clandestinos pipocavam no noticiário, tornou-se urgente a diferenciação da marca junto ao público consumidor. Era o início de uma nova fase para a JBS e sua Friboi.

A carne in natura deveria deixar para trás o estigma de commodity para se exibir nas gôndolas como produto de marca e, mais, com benefício emocional. “Se até o arroz, que antigamente era comprado em sacas a granel, possui marcas de valor nos pontos de venda, por que com a carne seria diferente?”, questiona Maria Eugênia Rocha, gerente de marketing executiva da JBS. “Depois tem outra, o Brasil representa o terceiro maior consumo per capita de carne do mundo, 47kg, atrás só da Argentina e do Uruguai, e o segundo maior em volume, perdendo apenas para os Estados Unidos. É um mercado muito poderoso para não ter marca”, completa Marcio Oliveira, Presidente da Lew’Lara/TBWA, agência que detém a conta da JBS. Mangas arregaçadas, canteiro de obras instalado: a construção da marca estava prestes a começar.

Maria Eugenia Rocha, da Friboi: “Queríamos alguém próximo do povo e que inspirasse confiança”. Ao lado, Marcio Oliveira, da Lew’Lara/TBWA: “Mostrar os métodos de produção para ganhar a confiança”
Maria Eugenia Rocha, da Friboi: “Queríamos alguém próximo do povo e que inspirasse confiança”. Ao lado, Marcio Oliveira, da Lew’Lara/TBWA: “Mostrar os métodos de produção para ganhar a confiança”

O Zé foi e se deu bem

A pedra fundamental foi lançada em outubro de 2011, com a primeira campanha publicitária desenvolvida para a Friboi – criação da Fischer&Friends. Veiculado somente em São Paulo como teste para avaliar a receptividade do consumidor, o filme “Vai, Zé” mostrava o Zé Mineiro, fundador da Friboi, nos idos 1955, quando divagava sobre a possibilidade de levar seu negócio para Brasília. Pela primeira vez na história da propaganda brasileira e da indústria frigorífica uma marca de carne bovina aparecia na TV para se apresentar e falar claramente em “garantia de origem” e “rigoroso controle de qualidade”.

Paralelamente, a marca estreava novo figurino – logotipo com mais cores e ondas, trabalho assinado pela 100% Design – e ganhava espaço no ponto de venda com materiais de ativação. “Até aquele momento não havia diferenciação no PDV. A etiqueta trazia informações técnicas, e só. Nós fizemos um movimento que acabou mudando a relação do consumidor com toda a categoria”, pondera Maria Eugênia. A estratégia deu certo: foram conquistados mil novos clientes no estado paulista. Quanto à etiqueta, ela fez e continua fazendo moda; agora, exibe até QR code, que permite rastrear a origem daquele produto, reforçando a preocupação da empresa com segurança alimentar.

Em dezembro de 2011, na semana de Natal, entrou no ar mais uma campanha – dessa vez, estrelada por cinco astros sertanejos: Zezé Di Camargo, Luciano, Victor, Léo e Luan Santana. Era a promoção “Miniastros Friboi”. Ao comprar produtos Friboi e guardar os selos, o consumidor tinha a chance de colecionar miniaturas dos artistas. Só na primeira semana saíram 400 mil bonecos de um total de 2 milhões. Vale destacar que já aqui é trabalhada a figura do açougueiro como avalizador.

“Miniastros Friboi”, estrelada por Zezé Di Camargo, Luciano, Victor, Léo e Luan Santana
“Miniastros Friboi”, estrelada por Zezé Di Camargo, Luciano, Victor, Léo e Luan Santana

É o Tony quem diz

Apesar dos resultados positivos, a JBS tinha objetivos ousados e contava com a propaganda nos veículos de comunicação de massa para atingi-los. Como informa a gerente de marketing, era necessário resignificar a categoria, e isso só seria possível criando uma “mudança cultural”. Ou seja, era preciso gerar repertório para que o consumidor, ao comprar carne, pensasse em marca e tivesse Friboi como referência. Quem abraçou o desafio foi a Lew’Lara/TBWA. “Não poderíamos falar dos atributos físicos da carne – cor, maciez e sabor –, porque isso está associado a uma série de fatores nos quais não exercemos controle. Focamos, então, numa palavra-chave: procedência”, afirma Marcio Oliveira. “Nos filmes de TV e nas peças para rádio, mídia impressa e online, abordaríamos o método de trabalho, a qualidade da Friboi. Entendemos que esse era o caminho para ganhar a confiança e a preferência do brasileiro”, acrescenta.

Se por um lado definia-se a mensagem – “popular e didática, simples sem ser simplória e com alto poder mobilizador”, como explica Oliveira –, por outro procurava-se o garoto-propaganda, o porta-voz, uma celebridade com forte conexão junto ao público. “Queríamos alguém que fosse próximo e querido do povo, que inspirasse confiança, mas que não tivesse a imagem desgastada na publicidade – até porque nosso nível de frequência seria alto. Tony Ramos foi o nome perfeito”, comenta Maria Eugênia Rocha. “Peça Friboi. Carne confiável tem nome” – a mensagem simples e contundente na voz de uma personalidade credível e adorada como Tony Ramos surtiu efeito de fato.

Cenas da vida real

Fase 5_LewLara3-2

Já que o propósito da campanha estrelada por Tony Ramos era “passar verdade”, como frisa a gerente de marketing executiva, nada melhor do que abrir as portas da fábrica. Na primeira fase, com filmes e demais peças criativas veiculados nacionalmente a partir de março de 2013, o ator global se posicionava em frente a telões que revelavam processos industriais rigorosos. Na segunda etapa (junho de 2013), estimulou-se um novo jeito de pedir carne; em situações diversas (no supermercado, no açougue, até no restaurante), as pessoas eram lembradas por Tony Ramos de questionar se a carne era Friboi. “Surgiram várias piadas e memes nas redes sociais brincando com a pergunta ‘É Friboi?’, sempre com conotação positiva. Friboi virou sinônimo de qualidade”, festeja o líder da Lew’Lara/TBWA. “Foi um dos momentos mais importantes de toda a comunicação”, completa.

Já na terceira etapa (setembro de 2013), para continuar gerando mobilização, o garoto-propaganda da Friboi aparecia em diferentes cidades do Brasil (Rio de Janeiro, Porto Alegre, São Paulo, Belo Horizonte, Recife) sempre junto a uma multidão, e os próprios consumidores davam seus depoimentos sobre como mudaram a forma de pedir carne.

A fase seguinte (fevereiro 2014) deu descanso para a imagem de Tony Ramos e colocou em cena Roberto Carlos. Confirmada a informação de que, após quase 30 anos, o ícone da MPB havia abandonado o vegetarianismo, a Friboi viu a oportunidade perfeita para aumentar ainda mais o conhecimento da marca. O comercial mostrava o “rei” sentado à mesa de um restaurante e, na sequência, a ele era servido um belo filé de carne bovina. Ao fundo, o refrão da música “O portão”: “Eu voltei agora pra ficar / Porque aqui, aqui é meu lugar”. O fato é que o bife ficou intocado no prato, e isso bastou para que as redes sociais fossem entupidas de piadas, provocações e dúvidas sobre os hábitos alimentares do cantor. Herbívoro ou carnívoro, Roberto Carlos, no frigir dos ovos, não funcionou como garoto-propaganda (pesquisas qualitativas indicam que o público não digeriu o “rei” no papel de um ser humano normal, do tipo que come), e o contrato de R$ 45 milhões teve que ser cancelado. A Friboi amargou o pagamento de uma multa gordurosa, mas prefere focar nos bons frutos que a parceria rendeu. “A marca atingiu awareness superbacana; crescemos mais de dois dígitos na sequência da campanha com ele”, argumenta Maria Eugênia Rocha. Vale ressaltar que o acordo entre Friboi e Roberto Carlos incluía, além de filme de TV, um pacote de ações de relacionamento. “Ao longo de um ano, ativamos a marca em todos os shows que ele fez. Estamos falando de 50 apresentações, com média de público de 5 mil pessoas por evento”, dispara Marcio Oliveira.

Roberto Carlos como garoto propaganda de Friboi: sequência interrompida, mas awareness em alta
Roberto Carlos como garoto propaganda de Friboi: sequência interrompida, mas awareness em alta

Ele voltou, o Tony

Na quinta etapa (abril de 2014), Tony Ramos voltou agora para ficar. O ator, que a essa altura já estava íntimo do pessoal do frigorífico, estrelou em cenas de família e amigos, dando parabéns às pessoas pela escolha Friboi. E os filmes foram embalados por canções de Roberto Carlos. Já na sexta (julho de 2014), cenários da vida cotidiana (área da churrasqueira, cozinha, supermercado e açougue) se misturam com dependências do parque fabril da Friboi. E são os próprios funcionários que contam alguns dos procedimentos adotados para garantir a qualidade do produto: testes frequentes, ficha técnica destacando cada etapa da produção, controle de temperatura, selo de inspeção federal, higiene. Finalmente, na sétima fase da campanha (janeiro de 2015), pessoas reais em situações reais (um casal fazendo compras no supermercado, um chef trabalhando no restaurante) pensavam estar participando de um documentário sobre alimentação, quando eram abordadas inesperadamente pelo Tony em carne e osso. Ele comprovava, então, que elas optavam por Friboi. “Nossa marca foi construída em cima da verdade. O que mostramos nos vídeos são métodos de trabalho. Nossas sacadas de marketing são simples, porque esse é nosso jeito de ser”, frisa Maria Eugênia.

No início de agosto, estreará a nova fase da campanha, com cenas gravadas em lugares inusitados. Como explica Oliveira, a intenção, agora, é instruir o consumidor quanto ao preparo da carne. “Daremos dias do que fazer com aquele produto. Para tanto, estamos grudando em chefs”, revela o presidente da agência, acrescentando que o foco do momento são ações de merchandising.

Está na TV, está na boca do povo

A campanha bem orquestrada entre Friboi e Lew’Lara/TBWA gerou resultados de deixar de barriga cheia até os mais esfomeados. Marca como critério de compra para carne dobrou de 2012 para 2014. O Top of Mind saltou de 19% em 2012 para 50% em 2014. Aumentaram sensivelmente os fatores Consideração (21% em 2012, 53% em 2014), Preferência (11% em 2012, 30% em 2014) e Recomendação (30% em 2012, 58% em 2014). Com relação ao Facebook, entre 2012 e 2014, o número de fãs saiu de 35 mil para mais de 1 milhão, e a média de menções “Friboi” subiu de 66 por dia para 1.500 por dia. O impacto no negócio da Friboi foi forte. Na comparação entre 2014 e 2013, houve alta de 200% na presença em encartes (folhetos feitos pelas redes de supermercados destacando as principais ofertas), queda de 4% do giro do estoque, elevação de 12% do número de clientes e crescimento de 26% do mix médio de produtos por loja.

Mensagem ao consumidor: se você tem dúvida, pergunte... “É Friboi?”
Mensagem ao consumidor: se você tem dúvida, pergunte… “É Friboi?”

De uma carne in natura com etiqueta sem graça a um produto de marca forte, bem posicionada e, ainda, com benefício emocional – a Friboi chegou onde queria, mas não se satisfaz. “Éramos uma marca com pouca expressividade junto ao consumidor. E para construí-la com velocidade e intensidade, tínhamos a necessidade de estar nos veículos de comunicação tradicionais, com ênfase para a TV”, declara a executiva. E adiciona: “Queremos estar onde o consumidor está. E cada vez mais ele está em todos os lugares e menos tempo em cada um deles. Acredito realmente na complementariedade dos meios. Esse mix é fundamental para que haja entendimento da mensagem, lembrança da marca e, acima de tudo, mudança de ação no PDV.”

JBS_numeros_840x

Jeito descomplicado de fazer negócio 

Origem humilde, perfil trabalhador, do tipo que pega firme na labuta quando o sol ainda dorme. Sem diploma, mas com tino para o empreendedorismo, José Batista Sobrinho soube transformar um pequeno negócio em Anápolis, Goiás, numa organização gigantesca, de expressão global. Se antes a capacidade de abate era de cinco bois por dia, hoje é de 100 mil – sem falar nos suínos (21.200 mil cabeças por dia) e nas aves (5,6 milhões por dia). “A pessoa para vencer na vida tem que ter uma garra, alguma coisa diferente. Como eu estudei muito pouco, o que posso oferecer é garra, pontualidade, determinação”, afirma, no vídeo institucional que remonta a trajetória da empresa. E isso valeu muito – Zé Mineiro é o nono homem mais rico do mundo, segundo o último levantamento da Forbes.

O jeito descomplicado de pensar e fazer negócio transcendeu geração e virou marca registrada da administração atual, encabeçada pelos irmãos Wesley e Joesley Batista (o primogênito José Batista Júnior foi o primeiro a assumir a direção da companhia). Essa cultura de simplicidade e informalidade ganhou até nome: Frog, “From Goiás”. Aliás, o modo Frog de ser e agir vale até para fechar a compra milionária da Swift & Company nos Estados Unidos, em 2007, sem nem falar inglês, como conta Wesley, orgulhoso.

Esta cultura da simplicidade, aliás, norteia todas as áreas da empresa. “Nossas sacadas de marketing são simples, porque esse é nosso jeito de ser”, afirma Maria Eugênia Rocha, gerente de marketing executiva da JBS. A comunicação, portanto, não poderia ser diferente. “É popular e didática, simples sem ser simplória e com alto poder mobilizador”, define Márcio Oliveira, presidente da Lew’Lara/TBWA.

Fase3_LewLara1_840x

Publicidade